terça-feira, março 24, 2020

Uma carta de amor do século passado

"O seguinte meu amor: os bandidos fazem o cerco e estou cada vez mais indefeso. Todos viram. Ali onde eu chorei, qualquer um chorava. Ser forte. Quanto mais quero, menos fico.

Ouça meu amor, O barulho tá cada vez maior e aquilo que ouvíamos foi só muita poesia, cada vez mais ao longe.

Venha, meu amor. Fica cada mais perto. Não tenha medo. Sou a maior proteção do mundo. Mentira, sou fraco. Tenho desejos que nunca serão concretizados. Tenho imaginação de sobra. Posso ver nitidamente a vida que nunca terei.  

O  que me acalma é compreender que sempre me adapto ao que acontece e ao que nunca acontecerá, eu sei,  por mais que eu deseje, estude ou trabalhe.  Enquanto caminho pelos vazios de Brasilia, faço melodias perfeitamente executáveis. Delas, às vezes, me lembro, em noites de insônia.  

Quero ir embora, embora. Você me chama e quero ficar.  Depois duvido. Em seguida, não duvido mais. Quero ficar. Tá tudo tão legal comigo. Rapaz novo, sem pressa, lutador.  Algumas certezas, muitas dúvidas, assim são os meus dias.

Quando volto  pra casa, alongo o percurso e vou me contando histórias tristes e felizes de todo mundo. Paro um segundo pra ler  os folhetos, espalhados pelo chão. Convocam outra greve geral que vai fracassar.  Me lembro de você, divina predestinada. Apresso meus passos." 

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