quinta-feira, junho 26, 2008

Viagem & Conversa -- O General

Dário engraxa os sapatos, na garagem de nossa casa de Taguatinga
Ainda não tinha completado 50 anos

Nos últimos anos de vida, mesmo sem ser tão velho, em torno de 65 anos, meu pai, já viúvo, com a mente estimulado pelos remédios que tomava sem atentar para a quantidade e horários, encucou que, nós, os filhos conspirávamos contra ele. O motivo: tentávamos impedir que ele vendesse tudo o que tinha em Brasília e comprar uma fazenda no Espírito Santo... quando, doente, não tinha condições nem de respirar de jeito.

O causo que o meu primo conta abaixo, ilustra bem este momento conturbado que vivíamos em família. Só não sabia que o problema tinha extrapolado as paredes de nossas próprias casas. Hoje, pensando bem, devíamos tê-lo deixado a mercê dos seus desvarios. Mas o amávamos demais e nos sentíriamos culpados se não tentássemos desviá-lo das idéias insanas que tinha. Idéias que iam e vinham numa rapidez enlouquecedora para nós, ainda muito jovens, mas já com responsabilidades pessoais de trabalho e filhos. Mas vamos ao causo:

Clara,
um dia tocou o telefone em casa e era o Tio Dário:

- Vem cá depressa, aconteceu uma confusão, muita discussão com meus filhos. Preciso de você aqui agora. Olha, passa na Lurdes e traga ela também. Não demora, viu?

Fiquei encucado. Liguei para Tia Lourdes e ela havia recebido o mesmo telefonema e achado o irmão muito nervoso. Passei na Tia e sem grandes demoras, mas também sem aquela pressa toda ordenada pelo General, chegamos na SQN 104.

Quando entramos ele deu um baita dum sorriso, como se tivesse chegado o seu exército de defensores:

- Sentem aí, vão passar a tarde comigo.

- O que aconteceu, Dário?

- Uma discussão e das grandes, os meus filhos podem chegar aqui a qualquer momento e eu preciso da ajuda de vocês e mostrar pra eles que eu também tenho força.

Minha posição foi deixar os dois irmãos conversarem, mas não saiu mais nada a não ser uma outra ordem para a Tia Lourdes fazer um café. A Tia ficou muito nervosa e quando fui para a cozinha (queria ajudá-la, ficar perto dela) veio a terceira ordem:

- Fica aqui, que ela não precisa de ajuda. Tudo o que precisa para fazer o café, ela sabe que tá na cozinha....(machão mesmo, né?).

O café ficou pronto e eu ajudava a servir, quando o Tio Dário tomou o primeiro golinho e esbravejou:

- Puta que pariu Lurdes, que café ruim, não tem açúuuuuuucar!!!

Tia Lourdes não aguentou e disparou:

- Ô Dário, deixa de ser sem-educação, se voce gosta mais doce é só falar com jeito, não precisa gritar assim....

Silêncio total.

Mais 5 minutos na sala e Tia Lourdes me convidou para irmos embora porque precisava de fazer alguma coisa urgente. Lá fora disse:

- Não preciso fazer nada não, é que fiquei com raiva dele. Você viu que grosseria? O Dário tá ficando louco, imagina falar que os filhos querem brigar com ele, são uns doces os filhos dele......

Até a próxima
Um beijo do primo
Paulo Afonso
Em tempo: até hoje não fiquei sabendo o que aconteceu naquela tarde com o Tio e nem se aconteceu mesmo alguma coisa. Entrei quieto, saí calado e não entendi porra nenhuma.


Comento:
Minha querida tia Lourdes realmente sabia o irmão que tinha, um homem de grande talento e de bom coração, mas extremamente ciumento e autoritário! Ela e minha mãe eram grandes amigas.

2 comentários:

  1. Clara,

    é a cara do seu pai!!!
    Sempre polêmico!!
    São tantas e tantas histórias.. Hoje em dia lembramos de todas elas com muito carinho... Mas algumas foram custosas à época.
    Enfim, uma figura inesquecível!!!

    Sueli

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  2. E apesar de já ir tão longe esse tempo, ainda somos afetados por suas bizarrices e excentricidades. Não vou chamar de loucura, pois teríamos que assumir a nossa própria. Afinal, a "genética é hereditária"!

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